agosto 21, 2020 | Crítica, ensaio, Daniel Jablonski, Feco Hamburger, Kika Levy, Pablo Ferretti

Caspar David Friedrich, O Caminhante sobre Mar de Névoa, 1818
Por Cadu Gonçalves
O Caminhante sobre Mar de Névoa, pintura à óleo de Caspar David Friedich de 1818, retrata um homem, de casaco preto e bengala na mão direita, de costas ao observador. Esse homem de identidade oculta está na beira de algo que parece um abismo, não se sabe se é o topo de uma montanha ou uma pedra que avança sobre o mar, só se vê que ele está à beira de algo e que o único caminho é o horizonte, com o imenso céu de referência. A névoa é um mistério sob seus pés e diante dos seus olhos. Essa nuvem perto do chão permite uma experiência de céu; a suspensão de gotículas de água, tornando líquido o vapor, altera rotas de navegação, paralisa o tráfego aéreo e instaura a deriva e a espera, tal e qual a história da orixá Euá, na cultura iorubá, cujo poder ao se transformar em névoa faz cessar a matança dos homens ao tirar deles a capacidade de enxergar com nitidez.

Com o nevoeiro, o olhar força-se a reconhecer a paisagem, que é esmaecida e confusa, mas reconhecível por seu recorte junto ao céu, assim como as gravuras de Kika Levy na série 360º (2019), que são ao navegante perdido a esperança de terra firme. A artista indica a imagem pelo contorno das montanhas, cuja forma feita por recortes em metal carregam a cada impressão o apagamento de sua cor, já que Levy extrai os azuis da tinta até sua inexistência. Ou pelo isolamento da figura, a exemplo de Bunker (2020), onde a imagem é a pele dos abrigos subterrâneos madrilenhos usados durante a Guerra Civil Espanhola; a textura das paredes é indício e imagem.
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