abril 1, 2017 | Crítica, ensaio, Heleno Bernardi

Ensaio sobre Apologia de Sócrates, de Heleno Bernardi, publicado no livro Apology of Socrates – Doors Galerie – 2006.
Por Roberto Corrêa dos Santos
Não se trata da beleza – trata-se do pensamento. Não que se despreze a beleza, pois bem importa; surge aqui a beleza, de início, pelo laborioso expressar de seu avesso. Um avesso que parece não mais ser, ou jamais ter sido, da tranqüila ordem do liso. Texturas ásperas e porosas compõem, cerca-se a imagem de voltas, curvas rudes, um certo desalinho, como se bem ali ocorressem miúdos distúrbios do adorno. Aquilo que contorna contraria o valor do acabado, rediscute os ideais de perfeição. O rosto de Sócrates o desdiz e ao mesmo tempo o reafirma. Nele, a longa história de suas perguntas, os vastos caminhos do mapa de suas preocupações, espalhados por toda parte e finalmente confluídos para aquele lugar do corpo. Lugar que o Ocidente convencionou como o mais próprio para focalizar o mito eternizado da beleza. E será bem aí, no rosto de Sócrates, que se reunirão, antes de qualquer outro ato adiante, multidões de traços miúdos por toda a superfície, a indicarem seu gradativo ruir, logo seu transformar-se, seu provável – embora impossível se vislumbrar quando – desaparecimento. Assim, expondo a primeira e provisória face de Sócrates, ainda não afagada, porém já sob a mira de uma inteligência irônica e rara, Heleno Bernardi dá-nos sua Apologia de.
Sócrates era feio, deixaram ver os discípulos próximos – Platão e Xenofonte – em suas diferidas Apologias. Sócrates era feio, gritara, alto, insistente e bem perto, Nietzsche. Talvez todas as buscas relativas ao fazer do pensamento e da arte tenham-se dedicado ao exame dessa guerra ativa ou, quem sabe, do acordo repleto de labor, entre beleza e pensamento. Para além de desmontar esse problema, Heleno irá agir, ultrapassando o sítio do rosto. Reconstruirá de Sócrates a cabeça. Trazida à cena, afugenta-se o rosto ou este se contrai.
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